Feminina
Os desprezos do corpo que vem a orla,
Os desprezos do corpo que vem a orla,
São
empurrados pela maré de ventania que sopra leve entre nossas pernas,
Já maduras
ou cansadas, vistas para que servem.
Queria
escrever um poema em prosa,
Mas que!
prosa alegre, nunca derrama uma lágrima, como deve ser.
Prosa fina,
reconta e inventa, mas não chega a doer.
Do que falo
aqui é da dor,
Do imenso
buraco que cresce sem que possamos ver.
Finge que é
tudo e nada e desmaia ao pesar longo do tempo passando.
Sobrevoando
pequenos pensamentos soltos numa janela imaginada,
Dá-se
pequena, encontra o mundo e volta, sem nada trazer junto.
Não ganha
nem perde, apenas se troca, fazendo intercâmbios com a ponta do ar.
Esmiúça a
solidão de ser, genericamente, uma só, intercalando faz-de-conta e sutilezas.
Queria
escrever um poema em prosa...
Mas que!
Prosa alegre, nunca deve ser derramada, isso só a poesia pode.
Mas pra ela,
não tem que ser alegre.
Tem que ser
firme.
Só eu sou
poeta, mais ninguém.
É isto que
afirma a mágoa, o chão, a cama, a janela e o olhar.
É isto que
afirma a delicadeza de um trovão, ou a brutalidade de uma flor.
Finjas que
sou leve, final feliz de todo história sintética.
Mas de
histórias benditas já estou cheia,
Não sou
mais do que um puro paladar que degusta cheiros e cores,
Adivinhando
qual será a tempestade de amanhã, que arrancará meus dias de glória e acabará
com todo o traço de história.
Isto está
se tornando uma prosa.
Não posso
deixar acontecer!
Volta-se em
círculos, rodando, sutil à sua imagem.
Sabendo o
limite da leveza e o peso da coragem.
Queria
escrever um poema em prosa,
Mas acho
que a mulher é isto mesmo.
Uma prosa
que derrama, pedindo permissão para a poesia para derramar.
Uma poesia
que sintetiza, pedindo permissão para a prosa para se contar.
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